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Comunicação Visual

30/10/2019

Uma Nova Forma de Educar

A Disciplina Positiva é Baseada em Amor e Compreensão    

Crianças educadas com amor e respeito possuem mais chances de sucesso, e isso inclui habilidades sociais, autoestima fortalecida, empatia e conexão com os outros ( Na foto, Danielle Toigo) Para muitos, o modelo referência de como foram criados ainda tem bastante influência na vida atual e é preciso muito estudo, autocontrole e paciência para conseguir aplicar algo diferente ( Na foto, Lívia Schoenau) "Educar com autoridade, mas sem autoritarismo nem permissividade, é o maior desafio dos pais atualmente" Isa Minatel

Quantas crianças passaram por punições, castigos, surras e humilhações durante a sua criação? Durante muitos anos, em muitas famílias, essa era considerada a única forma de educar. Antigamente, o acesso à informação não era facilitado como hoje. Tampouco se conhecia tantas possibilidades de educação (entre rígidas disciplinares às libertárias). Em meio a tantas opções, há uma baseada em amor e compressão, a Disciplina Positiva.“Muitos de nós fomos educados de maneira rígida e autoritária. Os pais mandavam e os filhos obedeciam, com ou sem utilização de punições físicas, mas em geral, com castigos e recompensas. Os tempos mudaram. Hoje, não precisamos mais agir como antigamente”, observa Danielle Toigo, educadora parental certificada pela PDA (Positive Discipline Association) – EUA, que dissemina a Disciplina Positiva em Caxias do Sul e região.

“Percebo que educar com autoridade, mas sem autoritarismo nem permissividade, é o maior desafio dos pais atualmente. Queremos ter relações saudáveis e conexão com nossos filhos, mas frequentemente repetimos padrões antigos (mesmo sem perceber) e ficamos perdidos, porque em geral, isso é muito desgastante. Muitos pais são rígidos em alguns momentos e permissivos em outros, dependendo de seu estado emocional. As crianças reagem a isso. E, em geral, reagem mal”, destaca Danielle. Para muitos adultos, o modelo referência, baseado no qual foram criados, ainda tem bastante influência na vida atual e é preciso muito estudo, autocontrole e paciência para conseguir aplicar algo diferente. Mas vale a pena! A cada ano surgem novas pesquisas apontando a efetividade e os benefícios que a Disciplina Positiva proporciona a longo prazo. Crianças educadas com amor e respeito possuem mais chances de sucesso, e isso inclui habilidades sociais, autoestima fortalecida, empatia e conexão com os outros.

Como Os Seres Humanos Que São

A Disciplina Positiva é um modelo de educação que visa proporcionar às crianças e adolescentes um ambiente que permita o seu desenvolvimento adequado. A proposta sugere que os pequenos sejam respeitados em sua integridade, adquirindo as habilidades necessárias para tornarem-se adultos mais felizes. É uma filosofia de educação que quebra padrões, estruturas enraizadas e propõe um novo olhar a respeito nossas futuras gerações. Pesquisas mostram que as crianças precisam da conexão com os outros, principalmente com os cuidadores, e que tendem a se tornar adultos melhores quando estabelecem vínculos fortes.

“A ideia principal da Disciplina Positiva é incentivar pais e educadores a enxergarem as crianças e adolescentes como os seres humanos que são, respeitando-os e entendendo-os, para que a educação seja mais efetiva e eles, mais realizados”, explica Isa Minatel, psicopedagoga, pós-graduada em Educação e Administração pela Fundação Getulio Vargas (FGV), mestre em Programação Neurolinguística e diretora pedagógica da MundoemCores.com, plataforma online de cursos para famílias e educadores. Ela soma 342 mil seguidores no Instagram.

A origem do conceito é dos anos 20, graças aos trabalhos dos psiquiatras Alfred Adler e Rudolf Dreikus, que ensinavam pais e educadores a lidarem com as crianças e jovens de modo mais efetivo, tendo como premissa o fato de que os seres humanos necessitam do senso de pertencimento e importância para se desenvolverem adequadamente. As ideias de Adler e Dreikus inspiraram Jane Nelsen, educadora e psicóloga, a escrever a respeito. Seu livro mais famoso, “Disciplina Positiva”, mostra como aplicar essa forma de educação na prática e destaca o quanto ela é importante.

Entre o Autoritarismo e a Permissividade

A Disciplina Positiva não é deixar a criança fazer o que ela quer, embora a falta de conhecimento a respeito dessa corrente possa estimular esse pensamento. “Na verdade, a disciplina positiva mostra que é possível educar com firmeza e gentileza, sem precisar recorrer à punições, humilhações e agressões. Ela funciona, nesse sentido, como um equilíbrio entre o autoritarismo e a permissividade. Você vai continuar dizendo ‘não’ para seus filhos, pois isso é essencial para o pleno desenvolvimento deles, mas vai fazer isso de modo respeitoso e buscando as causas dos maus comportamentos, ao invés de apenas puní-los. Isso faz toda a diferença”, pondera Isa.

O método visa ainda ensinar as habilidades sociais necessárias para que a criança lide melhor com as pessoas e com si mesma na vida adulta. Quanto mais valorizada e equilibrada emocionalmente, maiores as chances de agir com resiliência e amor. Os principais fundamentos da Disciplina Positiva são estimular a conexão, o respeito mútuo, ensinar habilidades sociais e de vida e potencializar a descobertas das capacidades.

Disciplina Positiva no Dia a Dia?

 “A Disciplina Positiva é uma abordagem que permite que possamos acessar nossos filhos com empatia, respeito mútuo, conexão e também limites. Ela nos oferece princípios e ferramentas para acolher os pais com suas dificuldades e olhar de maneira mais profunda para o que pode estar por trás do comportamento da criança ou adolescente. Não se trata de pensar em certo ou errado e, sim, de buscarmos juntos soluções mais saudáveis para cada desafio”, explica Danielle. Essa abordagem faz tanta diferença que, quando pensamos sobre tudo isso, melhoramos significativamente a qualidade da nossa relação com as crianças, da educação que oferecemos a elas, dos potenciais que a ajudamos descobrir sobre si e que poderão ser utilizados de forma a servir a todos que estiverem a seu redor no futuro.

“Tenho um filho de dois anos e sete meses e eu aplico a disciplina desde que nasceu. É desafiador, porém, os resultados são inegáveis. Consigo me conectar com as suas necessidades e tratar diretamente o problema. Consigo entender o que está causando o seu mau comportamento, por exemplo. Nem sempre é fácil identificar (afinal, temos muitas variáveis), mas é possível, com muita conversa e paciência, analisando o ambiente, como foi o dia ou até mesmo olhando para mim mesma - pois os filhos absorvem tudo. Acredito que uma educação respeitosa e empática refletirá em uma geração com mais amor ao próximo”, avalia Lívia Schoenau, professora de inglês e coach de mães. Ela criou um grupo de Whatsapp com o objetivo de reunir mães que “pensam fora da caixa”. O intuito é estudar criação com apego e disciplina positiva, compartilhar experiências e ajudar-se, fortalecendo a rede de apoio.

Educar é um desafio para qualquer ser humano. Por isso, é preciso estudar para ser pai e mãe, buscar ser melhor a cada dia, não apenas com discursos, mas também com exemplos, sabendo que assim poderemos realmente potencializar o processo da criação. Com amor, carinho, diálogo e compreensão é possível criar um filho verdadeiramente feliz.

 

ENTREVISTA COM ISA MINATEL

Qual é o principal desafio dos pais na educação dos filhos hoje?

Para alguns, são as birras, a dificuldade de obter obediência. Para outros, é o equilíbrio entre sair do modelo autoritário sem cair na permissividade. Outras famílias tendem à permissividade quando querem fugir do modelo autoritário. Para outras, ainda, é lidar com o temperamento da sua criança.

Você destaca a importância dos seis primeiros anos de vida para o desenvolvimento humano. Por que essa primeira etapa é tão valiosa?

Com o avanço das imagens cerebrais e das tecnologias de estudo do cérebro, os pesquisadores têm pontuado esse período de zero a seis anos, da primeira infância, como determinante para tudo o que a pessoa vai sentir, pensar e agir, bem como a forma como ela vai se comportar, para o resto de sua vida. Este período seria a base para tudo que virá depois. É como uma construção. Se você quer fazer um quarto no andar superior na casa, você chama um engenheiro, ele olhará a estrutura e dirá ‘com esta fundação que tem aqui, não tem como subir um segundo andar’. Ou ele dirá, ‘sim, há uma fundação aqui, suficientemente forte, para subir um segundo andar’. É mais ou menos isso na vida das pessoas. Com uma bela fundação dos zero a seis anos nas questões emocionais, essa criança terá condições de passar, na vida adulta, por experiências, frustrações, problemas, perdas, talvez sem cair em depressão, por exemplo, sem abusar de medicamentos ou substâncias tóxicas. Uma boa base diminuirá a chance de ela ter problemas se precisar enfrentar um período de sobrecarga emocional. Também vale para o aspecto cognitivo. Quando você tem uma criança que apresenta dificuldade de leitura aos sete anos (por exemplo), muitas vezes, essa criança, entre os seus zero a seis anos, teve pouco estímulo, não teve chance de contar histórias aos seus cuidadores adultos, ou, talvez, não tenha sido ouvida.  

Quais são os efeitos das práticas autoritárias, como gritos e castigos, na educação das crianças?

A maior parte de nós foi educada no sistema de gritos, castigos, punições. O que isso faz? O cérebro é ativado com bastante intensidade e frequência, e quando esse é o modelo adotado de educação, o sistema de estresse do organismo libera cortisol e adrenalina, e a amígdala cerebral é ativada. Isso faz com que a criança fique muito mais reativa, o instinto de “lutar ou fugir” fica ativado, ou seja, ela fica na defensiva ou no ataque, dependendo do temperamento. Ela terá dificuldades com humor, sono e aprendizagem. Poderá ter problemas de crescimento e de saúde, porque tem este sistema ativado constantemente. A criança entra no chamado estresse tóxico, e aí tendem a se desencadear um monte de situações complicadas no seu desenvolvimento. Se formos um pouco além e conseguirmos fazer uma conexão entre este padrão (que vigorou nas gerações anteriores), perceberemos, nos adultos de hoje, depressão, problemas com distúrbios alimentares, distúrbios do sono... aumento do índice de suicídios. Quantas pessoas precisam de medicamentos para regular as próprias emoções? Nesse modelo de educação, a criança não é ensinada a regular as emoções, é ensinada a guardá-las: não pode ficar bravo, não pode ficar com raiva, tem que obedecer! Ela não saberá regular as próprias emoções na vida adulta. Com as demandas que a vida vai impondo, essa pessoa acabará recorrendo aos remédios. Então, respondendo, por fim, as práticas autoritárias podem trazer muitas consequências tristes, danosas e perigosas à vida das pessoas. É realmente sério.

Texto | Marina Grandi - Edição | Valquiria Vita e Caroline Pierosan