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Consultoria Exclusiva

04/03/2019

Eu Vejo Oportunidades

Conheça Jaime Andreazza, idealizador e atual diretor administrativo da maior rede de supermercados da Serra Gaúcha

"Somos pioneiros no uso da tecnologia no nosso segmento na Serra Gaúcha. Falo do nosso aplicativo. Apenas redes multinacionais têm algo parecido. E já temos outros projetos encaminhados" (Jaime Andreazza). Foto: Josué Ferreira "O meu maior desafio é tentar estar mais próximo das pessoas que trabalham comigo" (Jaime Andreazza). Foto: Josué Ferreira "Temos muitos casos de empresas grandes da nossa Região que não conseguiram achar sucessor. Vemos senhores de 80 anos ainda à frente dos negócios. A culpa é deles? Não sei..." (Jaime Andreazza) . Foto: Josué Ferreira "Se você não tiver estoque, nunca saberá o quanto está deixando de vender" (Jaime Andreazza). Foto: Josué Ferreira "A pessoa que estamos preparando na nossa empresa hoje, como possível sucessor profissional, começou com a função de empacotador" (Jaime Andreazza). Foto: Josué Ferreira "Nós gostamos quando o cliente reclama, porque isso significa que ele está nos dando a chance de acertar. Significa que ele quer voltar para a nossa loja" (Jaime Andreazza). Foto: Josué Ferreira "Se não fosse dono de supermercado o que seria? Não sei, gosto muito do que faço! Tenho paixão pelo meu trabalho!" (Jaime Andreazza).  Foto: Josué Ferreira

“Estou fazendo isso por ti!”, avisou logo Jaime, com seu sorriso carismático e amoroso. De postura mais reservada no que tange à imprensa (embora extremamente relacional e atuante na comunidade e nas entidades que representou e ainda representa, em funções de liderança - como CIC de Caxias do Sul e Sindigêneros), Jaime abriu uma exceção e aceitou o convite da NOI para falar sobre sua trajetória. À frente da terceira maior empresa empregadora de Caxias do Sul (depois de Marcopolo e Randon) ele recebeu a equipe da revista numa manhã de sábado (que é quando consegue estar mais tranquilo) para falar sobre sua vida de empreendedorismo. “Não gosto muito de falar em público. É uma questão minha. Mas se tu me perguntares sobre o meu negócio, eu me viro muito bem!”, afirma, modesto.

De fato, é notável sua paixão pela empresa, a cada tópico abordado, ao tratar de cada capítulo da emocionante história que compõe a trajetória da marca Andreazza (nome de família) ao longo de cerca de 50 anos, na Serra Gaúcha. Tendo adquirido a marca do pai, Jaime e os irmãos (Marcos, Vitor e Mauro) desenvolveram a empresa até consolidá-la em uma rede de supermercados com unidades em Caxias do Sul, Flores da Cunha, Farroupilha, Bento Gonçalves, Carlos Barbosa, Arroio do Sal e Vale Real, empregando, hoje, cerca de 3 mil funcionários. Não bastasse, há planos para mais. “Uma loja de 150 funcionários será inaugurada ainda esse ano, em Caxias do Sul, na BR 116, e outra, na mesma cidade, na Rua Moreira César, no mês de abril. Então teremos 35 mercados”, contabiliza o empresário.

Um dos nossos desafios, no dia em que realizamos a entrevista, seria captar, para a nossa primeira edição 2019, um sorriso de Jaime Andreazza, 58 anos, caxiense, diretor administrativo da maior rede de supermercados da Região. A conversa foi ampla, perpassando passado, presente e futuro, culminando com um tour, guiado por ele, por toda a sede administrativa da empresa, o mercado Super Andreazza do bairro Kayser. Passamos por diversos setores mas, em nenhum momento, os olhos dele brilharam tanto como quando chegamos ao estoque. Ali sim! Conseguimos seu melhor sorriso! Ao contemplar as “montanhas” de mercadorias bem colocadas, cada qual em sua respectiva prateleira, as equipes trabalhando na organização dos itens, “usem a escada, gurizada!”, alertou, ao passar, apressado... ali, de fato, pudemos entender perfeitamente como é o seu mundo! Lembramos da situação da greve dos caminhoneiros (que quase paralisou o país inteiro, durante cerca de uma semana, no segundo semestre de 2018), “foi complicado para o país, porém uma ótima oportunidade para nós”, revelou, “pois nada faltou em nossas lojas; apenas alguns itens do setor de hortifrutigranjeiros e coisas que precisavam ser mais frescas. No mais, mantivemos o mesmo serviço”, recordou, orgulhoso.

A lição vem da infância. “Nunca gostei de ver uma prateleira vazia. Lembro que, na época em que ainda trabalhava no armazém do meu pai, toda a semana de pagamento faltava maionese. Comecei a me questionar se não estávamos comprando pouco desse produto e fui aumentando a encomenda, aumentando, aumentando, até encontrar o ponto de equilíbrio, que era muito, muito maior do que eu imaginava”, assume. “Desde então aprendi que, se você não tiver estoque, você nunca saberá o quanto estará deixando de vender”, concluiu, olhando, satisfeito, para a incrível quantidade de mercadorias que gira no subsolo da sede da empresa.

Prosseguimos nosso passeio. Jaime viu um item no chão, abaixou-se para coletá-lo e colocá-lo de volta no local apropriado. Com simplicidade e rapidez, o fez. “Agora estamos já pensando em novas formas de arrumar os hortifrutigranjeiros – minhas referências são dos supermercados dos Estados Unidos”, conta. Em um tour completo, ele nos levou, além dos estoques, à oficina de reparos de maquinário, ao setor de RH (com suas paredes repletas de pastas azuis, contendo a bem organizada documentação dos cerca de 3 mil funcionários), ao auditório para treinamentos da empresa, ao setor fiscal, de auditoria, ao consultório médico, e, até, ao depósito onde são guardadas as balanças mais antigas. “São equipamentos bons, a questão é que estão um pouco lentas para o nosso perfil de loja, você imagina o dia a dia, com o mercado cheio... mas vamos encaminhar para que ainda possam ser usadas”, planeja, atento ao reaproveitamento de todas as ferramentas.

Ao longo de nossa entrevista Jaime contou diversos fatos marcantes de sua história, episódios que, embora pareçam simples, foram fundamentais para forjar o líder de equipes que hoje ele é. Entre eles a frustração de reprovar em matemática, no último ano do Ensino Médio, período em que ele tinha recém passado no vestibular. “A professora reprovou 99% da turma, só um dos alunos passou. Eu fiquei tão desgostoso que não quis mais estudar naquele ano”, relata, quando perguntamos por que ele não quis concluir uma graduação acadêmica. “Aprendi no meu trabalho”, contesta, seguro. Também, ao longo de nossa conversa, vieram à tona lições positivas, como a caixa de ferramentas que ele ganhou de seu supervisor de primeiro emprego, a felicidade do presente, fazendo-o entender, para sempre, que as influências podem ser boas ou más, e, principalmente, quão poderosa pode ser uma atitude positiva na vida de uma pessoa jovem. Símbolos bonitos marcam a formação de Jaime Andreazza, como o primeiro par de botas de borracha que, ainda criança, ele comprou com o próprio dinheiro, conquistado vendendo bergamotas nos Pavilhões da Festa Nacional da Uva. “A primeira coisa que fizemos, meus irmãos e eu, quando conseguimos comprar as nossas primeiras botas de borracha, foi ir sapatear no banhado! (risos). Éramos felizes com coisas simples!”, relembra, comentando que, hoje, as novas gerações têm acesso a tudo muito fácil e isso, algumas vezes, pode gerar certas dificuldades na formação de um empreendedor.

Embora não tenha o diploma acadêmico para exibir, ao longo da vida, Jaime procurou conhecimento em cursos (até mesmo no exterior) que pudessem suprir suas necessidades técnicas na área de gestão administrativa, marketing, finanças e gestão de equipes, mas garante que, é na vida prática, e na convivência com as pessoas, que estão as maiores lições. “Sempre que alguém está falando algo que me interessa eu paro, escuto com muita atenção. Quando possível indago a respeito. Inclusive sobre aspectos da sucessão familiar”, confidencia. Mesmo tendo comprado a empresa do pai (em sociedade com outros três irmãos), e, agora, tendo também, seus dois filhos (Mateus e Diogo) sob seu comando, Jaime diz que nunca buscou assessoria profissional para tratar dos desafios da empresa familiar. “Aprendi ouvindo, e observando outros grupos empresariais, que o segredo é ser profissional! Quando eu e meus sócios sentamos na mesa para conversar somos quatro diretores de empresa. Quando a reunião acaba e levantamos da mesa para tomar um café, aí voltamos a ser quatro irmãos! Ninguém interfere na vida particular de ninguém. Mas, no que tange a empresa, seremos sempre mutuamente cobrados”, assegura.

Quando perguntamos sobre quem, dos filhos dos sócios, trabalha na empresa, os olhos de Jaime reluziram discretamente ao falar dos seus: Diogo e Mateus. “Eu sempre disse que, se quisessem, poderiam atuar em outras áreas. Mas sempre lhes ensinei a trabalhar, desde pequenos. Hoje eles permanecem aqui comigo”. Jaime pegou o celular e mostrou um vídeo gravado por Mateus para parceiros da Coca-Cola, agradecendo os rendimentos do último ano. “Ele não gosta de falar, como eu!”, comparou o pai, embora a desenvoltura do jovem seja excelente. “Recentemente ele viajou para o exterior para realizar uma pesquisa sobre tecnologias voltadas ao segmento supermercadista”, revelou. “Foram ele, meu irmão Marcos, e o gerente comercial. Veja bem, essa outra pessoa começou a trabalhar conosco como empacotador. A maioria dos meus líderes nascem assim. Nós os formamos dentro da empresa”, revela, destacando que a equipe participou da NRF 2019, maior feira de varejo do mundo (e a mais antiga também), sediada em Nova York. A 108ª edição da National Retail Federation foi realizada entre os dias 13, 14 e 15 de janeiro de 2019, no Jacob K. Javits Convention Center. Participaram 37 mil pessoas, 16 mil varejistas, 3.500 empresas e 700 expositores, envolvendo 99 nacionalidades de todos os continentes, entre eles, os representantes da marca Andreazza.

Ao longo do passeio pelo mercado ele nos contou que, assim como seu pai, também já enfrentou a depressão (e, exatamente por causa da doença, que acometeu o patriarca, é que começou toda a história do envolvimento de Jaime com o, na época, Armazém Andreazza, conforme contaremos ao longo da entrevista). “Comigo aconteceu por volta dos 45 anos; me senti cansado, desgastado. Mas já tinha aprendido a lição com a experiência que tivera com meu pai. Na época ele ficou 30 dias de cama. Foi por isso que eu comecei a trabalhar no armazém Andreazza que ele tinha, para ajudá-lo. Então, quando aconteceu comigo, logo percebi e procurei ajuda. Optei por me tratar. Tenho muita responsabilidade para me deixar abater”, afirmou. Concluindo nosso passeio, passamos pelos caixas. “As pessoas não imaginam o trabalho que dá para que alguém possa chegar ali, pagar a compra e ir embora tranquilamente com a sua mercadoria. É muito trabalho, mesmo”, assumiu, feliz por ver tudo funcionando na ampla guia de caixas do mercado Kayser. Foi quando perguntamos, “de todo esse processo, o que é mais desafiador?”. Jaime não titubeou em responder. “O que eu sinto mais falta - e o meu maior desafio - é poder estar mais próximo das pessoas que trabalham comigo.

Eu gostaria de ter mais tempo para me relacionar com todos, para investir de fato, de uma forma mais próxima nas suas vidas. Tenho muito em conta que preciso retribuir a dedicação das pessoas. Essa entrevista mesmo, só estou dando para ti, pois somos amigos da tua família há tanto tempo, te vi pequena, junto com meus filhos. Então o estou fazendo, pois eu raramente pararia para isso. Abri essa exceção, também, em outra ocasião, a pedidos de uma funcionária. Dei uma palestra para a sua turma de conclusão de curso na FTEC. Ocorre que, sempre que eu precisei, ela me ajudou. Sempre que pedi ela ficou mais do que a carga horária prevista, me “quebrou vários galhos”. Então, para ela, eu passei por cima do meu receio e fui palestrar! Acho que isso de não gostar de falar em público é algo que vem ainda da minha infância. Vocês não sabem quanto bullying eu, ‘o coloninho do interior’, sofri! Não foi fácil na época da escola!”. Lembra Jaime, com uma certa melancolia no olhar e uma gargalhada divertida para disfarçar. A seguir, apresentamos, com todo o orgulho, nossa entrevista com Jaime Andreazza, diretor administrativo da maior rede de supermercados da Serra Gaúcha.

NOI: Como estão as coisas no muito comentado, Super Andreazza de Arroio do Sal?

Jaime Andreazza: Durante a temporada, está muito bem! Agora, nesse período, já era esperado que teríamos um volume de vendas excessivo, acima do normal. Mas estou aguardando para avaliar depois de um ano.

Imaginavas que haveria esse “clima de torcida” da comunidade por ter a tua marca lá ?

Não pensávamos que seria tanto! O dia da inauguração foi o que mais me chamou atenção. Cerca de 12 mil pessoas passaram por lá, quando a cidade tem 9 mil habitantes. Foi muito bacana. Recebemos um a um, na porta. Acompanhei pessoalmente pois é meu costume receber o nosso fornecedor e o público, ter esse contato. A gestão da nossa empresa acredita em ter contato direto com a operação e não em ficar trancado dentro de um escritório. Nós, os irmãos, estamos sempre presentes nas nossas inaugurações.

Achas que o “feeling” do momento pode dizer algo “a mais” sobre o negócio?

Claro. Podes sentir o que o cliente quer. A felicidade dele, ou não... se ele está gostando do que foi feito, da loja, se está bonita, se tem a variedade que ele imaginava, então ali se escuta tudo. Por que, senão, as informações demorariam muito a chegar.

Achas que a rapidez na resposta é o segredo?

Com certeza. Um dos segredos do negócio é ser ágil. Outra questão é nunca deixar faltar mercadoria. Quando se deixa faltar mercadoria, nunca se sabe o quanto foi deixado de vender. Quando se vende, se consegue medir. Isso eu aprendi muito cedo, ainda quanto tínhamos apenas o armazém do Bairro Serrano. Tinha um produto que, todo o dia de pagamento, ele faltava. Era maionese. Saia o pagamento e dois, três dias depois, a prateleira estava vazia. E eu pensava “como assim?”. Então comecei a cuidar. Cada vez comprar mais e mais, até que achei o equilíbrio e descobri qual era o real potencial de venda daquele produto – era muito além do que eu pensava.

Quais são os três itens mais vendidos pela empresa hoje?

Vou te falar por departamentos: açougue, hortifruti e mercearia. Não necessariamente nessa ordem.

Pretendem abrir outras lojas no litoral?

Precisamos agora esperar pelo menos um ano para fazer o ciclo todo da loja de Arroio do Sal e, então, avaliar se prosseguimos por ai.

Em outras cidades do Rio Grande do Sul?

Conforme sentirmos a necessidade, estamos sempre prontos a ir!

Chegaram a pensar em expandir para outros estados do país?

Não, ainda não. Nossa empresa é grande para Caxias do Sul, grande para a Serra Gaúcha, mas, comparando a nível nacional, é pequena.

Mas seria um sonho teu?

Não necessariamente. Eu gosto de dar um passo por vez. Brinco sempre que, até 100 lojas eu consigo cuidar, depois disso não sei! (risos)

Tens um plano para prever em quanto tempo alcançariam esse número de lojas?

Não temos esse tipo de análise. Vamos passo a passo e estamos sempre avaliando as cidades. Já cogitamos Veranópolis, São Marcos, Vacaria, Gramado, Canela, Nova Petrópolis, São Sebastião do Caí, Bom Princípio. Estamos sempre olhando onde surgem as oportunidades...

Chegaste a fazer uma formação nos Estados Unidos? Eles têm muito essa questão de meta, deu pra sentir isso muito forte?

Na verdade a minha formação foi mais voltada às questões das empresas familiares, sobre como desenvolver as competências das pessoas. Também fizemos muitas visitas técnicas. Já coloquei muitas coisas em prática do que eu vi. Mas temos que ver que, muitas coisas da cultura deles lá, não servem para nós aqui. A gente tem que ir adaptando, testando, a cada loja nova, se o público entende esse projeto. Não dá para simplesmente pegar o que os americanos fazem lá e trazer para cá.

O que, por exemplo?

Horitfruti, o jeito de colocar os produtos. As coisas ficam mais bem colocadas, mais expostas, o visual mais bonito. A referência é que eles têm isso mais organizado, a iluminação direcionada. Lá eu vi lojas extremamente voltadas a atendimento, desde tirar a mercadoria do carrinho para as pessoas, como outras totalmente voltadas ao autoatendimento, onde tu mesmo vais no caixa com a mercadoria para pagar, sem atendente. Eles têm as duas coisas. Aqui, agora, tem uma febre desse padrão, o “atacarejo”. Nós estamos pensando nesse tipo de operação em que a mercadoria fica mais barata e não tem atendimento nenhum. Temos que ver o que o nosso cliente quer.

Por que a opção por essa política de “um passo de cada vez” ao invés de estabelecer metas mais ousadas?

Quando se dá o passo muito grande, o risco também é muito grande. Já experimentamos várias metodologias. Já abrimos uma loja por ano, já se comprou cinco lojas de uma única vez, já - em três dias. Já pegamos a chave e já saímos operando... Já cansei de comprar loja, conversar com o vendedor no final do expediente e sair com a chave no bolso, para, no outro dia, abrí-la com a nossa bandeira. Tudo depende!

Quando foi o momento exato em que percebeste que não iria procurar emprego numa grande empresa de Caxias do Sul (como era o sonho de muitos adolescentes na época) e que serias empreendedor? Quando foi que tiveste essa certeza pela primeira vez na vida?

Trabalhei no Teodósio Randon e meu pai passou a precisar de uma pessoa para lhe ajudar no mercadinho. Precisava de alguém para fazer tudo, no geral. Meu pai ficou doente e eu tive que assumir. Ele ficou 30 dias de cama. Com os 15 anos que eu tinha... me deu medo. A loja era embaixo da casa. Eu fazia as coisas e sempre subia conversar com meu pai, que sempre me apoiou. Ai comecei a adquirir confiança. Dali por diante, só deslanchei.

E quanto aos irmãos, o que faziam nessa época?

Eles trabalhavam fora, tinham outros empregos. O Vitor trabalhava na Mecânica Rodoviária na época, o Mauro também e o Marcos trabalhava na Toniolo Busnello.

Foste o primeiro filho a deixar o emprego para ir trabalhar no mercado?

Sim. Depois que o pai se aposentou ele nos disse: olha, vocês querem comprar esse negócio? Se não eu vendo para outro! Então meus irmãos entraram no negócio depois. Começamos a nossa sociedade em 1987.

Como é trabalhar numa empresa, de terceira geração familiar e ter sucesso? Qual o segredo para dar certo?

Ser profissional. Não se pode levar “os sentimentos” para dentro da empresa. Quanto se senta numa mesa de reunião sentam, de fato, quatro diretores para discutir os assuntos da empresa. Temos as funções bem divididas. O Marcos é o Diretor Comercial, o Vitor cuida da parte Jurídica, eu cuido de toda a parte de pessoal (RH), marketing e da expansão da rede, e o Mauro cuida do administrativo, do financeiro e fiscal. Então a gente senta, faz a reunião, quem tiver que “levar pau vai levar pau”. Às vezes, “pega fogo!”. Depois, quando a gente levanta, o combinado é que então levantam quatro irmãos para tomar café e acabou. Cada um faz o seu dever e na outra semana se resolve o restante que ficou pendente. É assim que a gente funciona.

Imagino que não tenha sido fácil alcançar esse ponto?

Não. Tivemos algumas divergências no caminho. Mas ai conseguimos entender isso, e foi muito positivo. A vida particular de cada um é de cada um. Agora, quando vamos para dentro da empresa, todos temos que andar na linha. E assim também com os filhos nossos. Quando eles entram aqui sabem que são funcionários. Também sempre conversei muito com eles sobre a questão da postura diante dos outros. Podem achar que eles serão tratados como “filhos de dono” então precisam dar o exemplo. Não ganham nada a mais do que qualquer outro funcionário na mesma função, às vezes até menos, e têm que desempenhar. Se não desempenharem, não ficam.

Houve algum tipo de assessoria ou consultoria para tratar a questão da empresa familiar?

Não. Mas eu sempre busquei muita informação sobre como funciona. A regra é: se for competente fica, se não for competente tem que sair.

Procuras ler sobre o assunto, então?

Sempre estou atualizado. Não é tanto a questão da leitura. Eu converso com pessoas, observo cases. A Fruki, por exemplo, fez um trabalho bem completo sobre essa questão.

Buscas conselhos, então?

Sempre. Não perco uma oportunidade de ouvir se a pessoa está falando um assunto que me interessa. Interajo e procuro buscar agregar algo com a experiência de outros empreendedores. Tenho bem claro que o sentimento dos quatro fundadores da empresa é um, porém o sentimento de quem vem de uma geração mais nova pode ser outro. Outro fator importante é a hierarquia. Quando sentamos para tomar decisões, somo apenas quatro. Depois cada um debate e discute os tópicos com o seu próprio núcleo familiar.

Estás entre duas gerações, bem no meio. Acreditas na sucessão profissional ou achas que a sucessão pode ser melhor se ela for, de fato, familiar?

Acho que pode sim, ser uma sucessão profissional. Estamos andando com duas linhas aqui. Treinando funcionários nossos e também os da família. E trabalhando com os dois juntos. Prevendo ambas possibilidades.

Caso alguém queira, está livre para sair?

Isso.

Esse é um conselho que você daria para outros empresários da Região?

Dar conselhos é bem complicado. Cada um tem que achar a sua forma. Temos muitos casos de empresas grandes na nossa Região que não conseguiram achar sucessor. Vemos senhores de 80 anos ainda à frente dos negócios. A culpa é deles? Não sei. Os demais, será que se dispuseram a assumir? Também não sabemos. Então, cada empresa precisa achar o seu ponto de equilíbrio, o jeito de fazer. As empresas familiares ainda têm muito a cultura do “dono”, aquele que veio lá de baixo, com tanto sacrifício, com tanta dificuldade. Então tem coisas que às vezes ele (o dono) fecha a mão, não quer abrir. Mas creio que tem que abrir, pouco a pouco, para as pessoas, para que elas possam entender como fazer as coisas. Meu pai, por exemplo, quando ficou doente, fez isso.

Ramo metalúrgico, de transporte, isso tudo, enquanto mantinhas o armazém do pai. Por que procuraste oportunidade em outros segmentos?

Na época meu irmão trabalhava na Randon. E ele chegou e perguntou – tu não sabes quem tem uma serra para serrar ferro? A empresa está precisando desse serviço, não tem equipamentos para tanto e estão dispostos a pagar por isso. Eu disse, "ué! Por que não compramos uma nós mesmos?". Fui atrás, e arrumei um sócio que tinha serra! (risos). Coloquei ele embaixo da minha casa e começamos ali. E então foi indo, aí eu estava atendendo no mercado e fiquei sabendo do pessoal da metalúrgica Polesso, que precisava de alguém que trouxesse areia. Fui ver quanto é que custava um caminhão. Verifiquei tudo e percebi que dava um lucro bom. Chamei meu irmão mais velho e disse – "tchê", nós temos um monza cada um, vamos vender os carros e comprar um caminhão! Dito e feito, foi o que fizemos! (mais risos). Puxamos areia muito tempo, lucramos bastante. No final já tínhamos duas carretas. E assim foi!

Falta isso um pouco nos jovens?

Acho que sim. Eles já chegam achando as coisas muito fáceis. Nessa época nós tínhamos muita necessidade. Não tínhamos nada e precisávamos trabalhar para adquirir as coisas. Hoje eles têm tudo num celular. O pai dá mesada. O grande erro das famílias é que elas não preparam o jovem para a vida. Dão tudo. Ele quer uma bicicleta? Ganha. Quer um tênis de marca, ganha, quer um celular melhor, ganha. Ele (o filho) tem estudo. Mas, enquanto não tiver prática e vontade de ter as coisas, não adianta. Eu noto ainda hoje, com todo o tempo que meus filhos já têm de trabalho comigo, e, apesar de tudo o que já passaram, do conhecimento que têm, do engajamento e participação nas reuniões, muitas vezes ainda tenho que dar uma ou outra “pincelada”. De vez em quando eu deixo eles quebrarem a cara e depois eu mostro – está vendo? Você está indo pelo caminho errado, tinha que ter ido por aqui, tem que prestar atenção, que isso funciona assim... Ensino-os a pensar adiante e a entender as consequências de cada decisão.

Apesar disso, vocês têm o projeto Primeiro Emprego. Como tem sido o desafio de lidar com as novas gerações?

Temos que treinar essa gurizada, incentivar, motivá-los para que tenham o gostinho de querer crescer, de querer ser um gerente, um supervisor. A nossa empresa dá muita oportunidade, em todos os setores. A pessoa que nós estamos preparando na nossa empresa hoje, como possível sucessor profissional, começou com uma função de empacotador.

Então acreditas muito nos jovens?

Sim. Eu lembro da minha história, no curto período em que trabalhei no Teodósio Randon (dos 14 aos 15 anos), lembro que ali tinha uma pessoa do bem. Tinha uma do mal e uma do bem perto de mim. O cara do mal roubava diesel dos caminhões, ele só me judiava. Imagina, eu, um “gringuinho vindo lá da colônia”, vocês não têm noção o quanto eu sofri de bullying. E tinha o cara do bem. Ele me ensinava as coisas, as coisas da vida, o serviço. Ele dizia – "olha, hoje você faz assim, faz assado". Essa pessoa um dia me chamou lá no almoxarifado e me deu uma caixa de ferramentas. Imagina a minha felicidade! Um dia, muitos anos depois, esse senhor entrou em um dos nossos mercados. Eu o chamei, reuni todos os funcionários em torno dele e contei essa história. Nunca esqueci da minha felicidade com aquele presente, nem do que ele me ensinava.

Percebeste a importância de uma pessoa motivadora na vida do jovem?

Sim! Às vezes me culpo por não ter mais tempo. Queria trabalhar mais com esses jovens. Ensinar, mostrar mais. Sempre que tenho uma oportunidade converso com eles, explico o porquê das coisas.

Vocês também valorizam pessoas na terceira idade e portadores de deficiência. Por que esses projetos na empresa?

É um privilégio trabalhar com eles. Trabalham bem e são muito atenciosos. É muito gratificante! Sempre incentivo outros empreendedores a fazerem isso. E o nosso projeto é inclusivo de fato. Nós trabalhamos com as suas famílias. Com os funcionários da terceira idade também é muito legal. Eles vêm para a empresa e parece que rejuvenescem, se revigoram.

O aplicativo lançado em 2018 que foi o maior sucesso. Vocês têm outras ideias para trazer a tecnologia para o segmento?

Esse é um dos propósitos da viagem da nossa equipe aos Estados Unidos. Mas agora o momento é de consolidar e avaliar esse “primeiro passo”, o nosso aplicativo. Como somos pioneiros nisso na Região (apenas redes multinacionais têm algo parecido), temos que avaliar bem a ação. Mas já temos, sim, outros projetos! Só que não quero dar ideia para os outros. Já nos copiam demais! (risos).

Qual é o teu maior desafio como dono de supermercado?

Lidar com as pessoas. Ensinar, treinar melhor as pessoas. Temos dois auditórios aqui dentro, temos professores. A gente os treina. Mas eu gostaria de ver esse pessoal cada vez mais capacitado. Quero que se sintam integrantes disso tudo. Que se sintam bem aqui. Que a experiência seja a que propõe o nosso slogan, “amigos das famílias”. Se o funcionário sai com raiva da empresa, ele não vai trazer a família dele para comprar nos nossos mercados, ele vai falar mal da nossa marca lá fora. Então temos esse cuidado, inclusive ao desligar as pessoas. De não deixá-las sair com um sentimento ruim. É importante nunca subestimar as pessoas. E ter carinho por elas. É claro que às vezes podemos errar, mas isso é do ser humano. Porém nossa intenção é sempre de gerar um ambiente agradável para que as pessoas possam produzir o seu melhor. Ao saírem, queremos saber que contribuímos para a formação delas, que colaboramos para que se tornassem pessoas melhores. Eu queria ter mais tempo para fazer isso.

Se não fosses dono de supermercado, o que serias?

Não sei. Gosto muito do que faço! Tenho paixão pelo meu trabalho.

 

TRAJETÓRIA
Jaime José Andreazza,  Vice-presidente de Comércio da CIC, nasceu em Caxias do Sul, em 1961. À frente dos negócios da família, ele foi presidente do Sindigêneros Caxias (2004-2007), primeiro presidente da Comissão de Impacto Econômico de Caxias do Sul e recebeu o Troféu Mercador em 1995. Atualmente, ocupa os cargos de diretor da AGAS, além de 1º vice-presidente do Sindigêneros Caxias.

 

“Nós vendíamos bergamotas nos pavilhões da festa da uva. O primeiro dinheiro que nos sobrou (para mim, e meus irmãos Marcos e Mauro), o que nós compramos? Um par de botas de borracha cada um. Chegamos em casa, calçamos as botas e fomos lá no banhado caminhar! Eu lembro com carinho disso. Nosso desejo, tão pequeno. Mas aprendemos muito e, dali por diante, ninguém mais parou. Meu pai comprava vinho ali nos Picolli e a gente ia com ele para os bairros, encima da camionete, vender. Aos 14 anos eu comprava lenha, vendia lenha em metro... e ia conquistando. Eu empreendendo” (Jaime Andreazza)

 

ENTREVISTA I CAROLINE PIEROSAN I FOTOS I JOSUÉ FERREIRA