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Oratória

05/07/2019

O Corpo, Um Santuário

Daniela Kappes é médica, nutróloga, e tudo o que indica, antes é testado por ela própria

"Sair da perspectiva de só curar a doença e partir para o modo de conquistar a saúde plena é o que faço, e acredito, a partir da visão da medicina integrativa" ( Foto: Jeferson Deboni )

“Hoje em dia valorizo muito o “eu interior”, cuido do meu corpo como um santuário e da minha saúde como meu melhor investimento e patrimônio”, afirma a  médica nutróloga Daniela Kappes. Ela prioriza atos como cozinhar em casa e criar receitas mais saudáveis para a família. “Compreender que não existem pessoa e vida perfeita e que somos de 'carne e osso', com vitórias e fracassos ou frustrações reais, dá paz ao coração e nos permite evoluir em relação a nós mesmos”, pondera. A seguir a NOI apresenta uma seleção de suas diferenciadas opiniões.

O que é mais desafiador ao lidar com a autoestima das pessoas? E com a tua própria?

É ao mesmo tempo desafiador e gratificante. As pessoas que buscam o meu atendimento normalmente chegam ao consultório muito abaladas sob vários aspectos: aparência e conflitos com a própria imagem, vida profissional, familiar, crise financeira ou de relacionamentos. Além de cuidar propriamente da saúde física dessa pessoa, entendo que a autoestima é essencial no processo de qualidade de vida. A autoestima está na base do que gera o autocuidado e o interesse por ser melhor. Hoje é muito comum a comparação com a realidade de outras pessoas. Meu papel muitas vezes é de ajudar quem me procura a entender que é um ser único, sem comparação. Acredito que é papel do médico olhar e compreender esses sentimentos e desejos impostos por uma cultura do “perfeito”. Compreender que não existem pessoa e vida perfeita e que somos de “carne e osso”, com vitórias e fracassos ou frustrações reais, dá paz ao coração e nos permite evoluir em relação a nós mesmos. Ser melhor hoje do que eu fui ontem é uma meta mais aceitável. É nisso que acredito, inclusive para minha vida pessoal. Então, eu procuro reforçar os aspectos positivos e mais “fortes” em cada um. Reforçar pequenas vitórias, como diminuir um ou dois números no manequim, sentir-se melhor, sair do sedentarismo, melhorar os sintomas relacionados a alguma condição clínica, melhorar o resultado de parâmetros laboratoriais. É um círculo virtuoso. Aplico todos esses conceitos na minha própria autoestima. Levo em consideração que sou humana e, como tal, também sofro com algumas oscilações e isso é o normal. Levo a vida regrada, procuro ao máximo cuidar da minha saúde e do meu bem-estar. Capricho na alimentação com alimentos frescos e orgânicos. Consumo aquilo que chamo de “comida de verdade”. Pratico exercícios com regularidade, cuido do sono, procuro manter estáveis minhas emoções, uso vários suplementos que promovem saúde. Assim, procuro seguir na minha vida os mesmos cuidados que recomendo aos meus pacientes. 

És teu próprio cartão de visitas?

Eu espero que sim, pois pratico tudo o que defendo como proposta de bem estar! Não seria legal e até mesmo ético que eu indicasse tratamentos ou medidas que eu não tenha implementado na minha própria vida. Felizmente, ao longo do tempo, a gente se “aprimora”. Hoje em dia valorizo muito o “eu interior”, cuido do meu corpo como um santuário e da minha saúde como meu melhor investimento e patrimônio. Na maioria das vezes, só percebemos o quanto somos ricos ou abundantes quando perdemos a saúde, quando vem a doença.

Graduar-se em uma determinada faculdade faz diferença para o profissional, ou é mesmo a rotina da profissão que ensina?  

Saímos muito crus da graduação e a especialização e a prática clínica são vitais para termos de traquejo clínico. Eu me formei em Medicina na PUC-RS há 20 anos. Naquela época, optei por me dedicar à oncologia clínica e trabalhei na área até 2009 e esse foi um período muito lindo na minha vida, que me trouxe a oportunidade de atender um universo de pessoas com sofrimento físico e emocional muito intenso. Em 2005, fiz uma especialização em Nutrologia na USP. Em 2016, conheci a medicina integrativa. Esse foi um momento decisivo para a minha carreira e profissão. Compreender a pessoa como um ser completo, holístico e complexo mudou o meu jeito de encarar a minha missão como médica. Percebi que olhar de verdade o todo da pessoa, sem focar só na dor que a motivou me procurar, fez perceber o quanto a medicina evoluiu na tentativa de promover a saúde. Sair da perspectiva de só curar a doença e partir para o modo de conquistar a saúde plena é o que faço e acredito a partir dessa visão da medicina integrativa. Claro que as especialidades são muito importantes, mas uma coisa não exclui a outra.

Todos buscam, cada vez mais, uma vida saudável. Isso faz com que o curso de nutrologia esteja cada vez mais em expansão. Como destacar-se neste meio? 

Eu fico muito feliz em perceber que a busca pela saúde plena é um movimento global e que está em ascensão também na nossa região, apesar do estilo de vida que temos aqui, com uma alimentação farta demais e com base essencialmente em alimentos refinados, o que não é nada bom para o nosso corpo. Essa cultura alimentar de consumir alimentos ultraprocessados e calóricos torna a função do nutrólogo mais árdua. Interagir com quem procura um estilo mais saudável passa pela derrubada da barreira cultural. Encontrar o gosto por novos alimentos, aprender a cozinhar em casa, criar receitas mais saudáveis para a família é um trabalho que vem ainda antes dos resultados esperados por quem procura ajuda que são saúde imediata e emagrecimento. Primeiro tem toda uma mudança de cultura e talvez esse seja o meu diferencial. Gosto do que faço e me dedico. Nesses últimos três anos também tenho realizado estudos de pós-graduações e cursos de imersão.

Como conceituas "empoderamento feminino"?

Por séculos as mulheres foram relegadas a um segundo lugar na sociedade. Desde a primeira queima de roupas íntimas até os dias atuais, as mulheres conquistaram o direito de estudar, assumir as funções que desejarem no mercado de trabalho e é comum que sejam elas as chefes de família na atualidade. Muitas conquistas deram protagonismo à mulher, mas a luta não finda aqui. A mulher ainda sente culpa por ser empoderada, ganha menos pelas mesmas atuações masculinas e ainda não é dona do próprio corpo. Entendo que o momento é de valorizar o respeito entre pessoas, incrementar a sororidade e nos permitir ser felizes, sem medos, sem angústias e que nossas dores sejam cada vez mais coisa do passado.

 

Entrevista | Marina Grandi -  Edição | Caroline Pierosan -  Foto | Jeferson Deboni