Abismo, Escuridão e Paisagens Deslumbrantes
* Eles poderiam ter ido de carro, afinal o Viaduto 13, também conhecido como Viaduto do Exército, o mais alto da América Latina, segundo mais alto do mundo, é tranquilamente alcançável pela RS 129 e existe um caminho simples e fácil pelo qual o visitante consegue chegar ao topo. Entretanto o desafio da aventura e superação falou mais alto. “Queríamos ver as belas paisagens da Serra, hoje só possíveis de serem contempladas por quem vai de trem”, explica Tainã Dossiatti, analista de suporte em TI.
O Viaduto 13 fica em Vespasiano Correa, em meio a Ferrovia do Trigo. Como viajar de trem neste trajeto é impossível, já que pelos trilhos só passam vagões de carga, eles foram a pé. Acompanhado pelos colegas de trabalho e amigos Roberto Clamer, coordenador de TI, e Evandro Abreu, vendedor, Dossiatti trilhou os 45 km, entre Guaporé e Muçum (conhecida como Princesa das Pontes) caminhando pela Ferrovia do Trigo.
No trajeto, túneis com até 2,0km de extensão, cavados entre os rochedos de pedra, e 20 viadutos interligam as montanhas e colinas da Serra. Nos túneis, apenas a luz da lanterna torna possível ver o passo adiante. “O silêncio absoluto provoca uma sensação de medo”, conta Clamer. Entre os viadutos, encontra-se o temível Mula Preta (com 98 de altura, 360 metros de extensão, sem proteção nas laterais) que precisa ser atravessado para que a trilha seja completa. “É possível ver a imensidão do vale pelas frestas entre os dormentes, é como se estivéssemos sobre nada, caminhando no abismo”, conta Clamer. “A vertigem é absurda. Depois de passar por ele fica um misto de arrependimento e satisfação pela superação dos medos, mas o risco é grande, é preciso ter muito cuidado”, alerta Dossiatti.
Como o trem ainda passa frequentemente pela Ferrovia do Trigo, a maior dúvida dos aventureiros é: o que fazer se ele chegar na hora em que você estiver dentro de um túnel ou sobre um viaduto? “Dentro dos túneis não há nada a ser feito além de jogar-se contra a parede e ficar imóvel, esperando o trem passar”, explica Clamer. Sobre os viadutos, a cada 15 metros, aproximadamente, existem refúgios (pequenas plataformas, com espaço para não mais do que duas pessoas), onde o aventureiro pode esperar até que a passagem dos vagões termine. “Algumas delas não têm mais a base que cedeu com o tempo, restando apenas a estrutura de metal, o que torna o percurso ainda mais incerto”, relata Abreu.
O ápice da aventura é chegar ao marco da grande obra – o Viaduto 13. Com 143 metros de altura e 509 de extensão, ele é menor apenas do que o Mala Rijeka, que fica em Montenegro (198m de altura e 498m de comprimento). O Viaduto 13 foi construído pelo 1o Batalhão Ferroviário do Exército e inaugurado em 19 de agosto de 1978. A edificação é considerada um “orgulho da engenharia brasileira”, conforme a placa de identificação colocada em sua base.
A proposta da caminhada atrai principalmente os mais aventureiros, já que não há nada no trajeto, além de trilhos e natureza. A trilha é dificultada pelo fato de precisar ser feita necessariamente por sobre os dormentes dos trilhos. “A distância entre os dormentes não é a ideal para o passo, então a caminhada fica lenta e incômoda. Fora dos trilhos, só cascalho solto, o que torna manter o ritmo uma missão praticamente impossível”, relata Abreu.
A aventura do grupo durou dois dias. Os amigos saíram de Caxias do Sul no sábado, cedo da manhã, e foram levados de carro até Guaporé onde começaram a trilha. De noite acamparam no meio do percurso, em um local chamado “Garganta do Diabo”, onde um córrego foi desviado para não passar sobre os trilhos. A caminhada foi retomada no domingo pela manhã. O grupo completou o trajeto no fim da tarde, ao chegar em Muçum. Embora tenha perdido duas unhas do pé na caminhada, Abreu não se arrepende. “Foi um desafio muito difícil de superar, mas o que compensa todo desgaste físico é a paisagem”, comemora. “O viaduto é sem dúvida uma maravilha para o visitante, cheguando ele de carro ou a pé, porque ali, do alto das montanhas pode-se ver passar, abaixo dele, o rio Guaporé. No horizonte, contempla-se a Serra coberta de vegetação intocada. É uma sensação indescritível”, incentiva Dossiatti.
* Matéria de Caroline Pierosan publicada na edição impressa setembro 2014 da revista NOI