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Pelo Mundo

09/07/2017

Peru: Uma Viagem No Tempo

"Ao visitar construções como Machu Picchu conseguimos ver que o trabalho era um valor fundamental da sociedade inca. Eles tinham três princípios: não seja mentiroso, não seja ladrão e não seja ocioso" (Foto: Caroline Pierosan)

Sempre tive um desejo muito grande de me aventurar pela Cordilheira dos Andes! Subir montanhas, percorrer trilhas por dias, descobrir locais que há centenas de anos eram percorridos por povos que fizeram história e que deixaram enigmas ainda hoje não desvendados! É admirável saber que neste ambiente hostil já existiu a maior civilização em extensão da América, os Incas. Por todo o caminho nos deparamos com suas obras. Sua cultura está enraizada no povo andino. As montanhas são consideradas Deuses pelos locais, que as veneram, acreditando que elas lhes podem dar - e também tirar - coisas. Por isso são tão respeitadas! Pode parecer um pouco místico, mas, só estando lá, entre os altos cumes, sente-se essa força. A partir daí é possível entender que, diante de tal imensidão, não somos mais que pó. Para nos ajudar na travessia de 75 km (em 5 dias) usamos a folha de coca. Sem ela seria muito difícil vencer os 4.630 metros de altitude que encontraríamos no Passo Salkantay entre os montes Salkantay e Humantay. A folha, considerada pelos incas alimento para corpo e espírito, além de conter diversas propriedades medicinais, é fonte de proteínas e vitaminas e alivia o “mal da montanha''. A folha de coca era muito utilizada para oferendas. Um dos rituais mais tradicionais é a K’intu - 3 folhas de coca, de distintos tamanhos são oferecidas, a maior a Apu (espirito das montanhas e picos andinos), a mediana a Pachamama, (mãe terra) e a menor à humanidade. A folha de coca simboliza um conceito de vida. Foram cinco dias de reflexão, a vida passando mais devagar, nos dando tempo para prestar atenção nos detalhes do mundo, que muitas vezes passam despercebidos, mas que são muito mais importantes que todos os problemas que enfrentamos em nosso cotidiano. Detalhes como, por exemplo, ser prazeroso simplesmente encher os pulmões de ar. Aventurar-se pelos andes requer uma readaptação corporal (a dificuldade de respirar pede movimentos menos bruscos e um caminhar mais curto) e um ritmo totalmente diferente do que levamos. Temos que desacelerar para prosseguir, o que também nos possibilita contemplar toda a beleza ao nosso redor. Refletir sobre os povos do passado e seus legados é de extrema importância para entender melhor a humanidade. É o ponto de partida para saber quem somos, onde estamos e onde podemos chegar. Ao visitar construções como Macchu Picchu conseguimos ver que o trabalho era um valor fundamental da sociedade inca que tinha três princípios: não seja mentiroso, não seja ladrão e não seja ocioso. Possivelmente tais princípios contribuíram para que construíssem seu grande império, nos deixando obras extraordinárias que resistem até hoje. Um destes princípios também pode ter causado a queda de seu império. Como defender-se dos espanhóis tendo como lei “não ser mentiroso”? Talvez isso tenha contribuído para serem enganados pelo golpe do espanhol Francisco Pizarro que prendeu o soberano Inca Atahualpa e o assassinou, tendo-o atraído com mentiras. A obra mais emblemática e conhecida do império inca, Machu Picchu, está localizada a 130km de Cusco a mais de 2.200 metros de altura. Profundos abismos dificultam seu acesso e ajudam a esconder a sua exuberância. Muitos acreditavam que os poderes do rei inca vinham dos Deuses e que nenhum homem poderia enfrentar o mundo sobrenatural. As montanhas são protagonistas de um cenário deslumbrante e ao mesmo tempo assustador por sua imensidão. A cultura desse povo está viva e representada nos nomes de seus líderes (bem conhecidos da comunidade local) que por muitos anos lutaram na expansão de seu império, construindo história, pedra sobre pedra. Aventurar-se pelo Peru é imaginar quem eram e como viveram os que antes de nós passaram por todos aqueles lugares. É viajar no tempo, experimentando um turbilhão de raros sentimentos.

Tainã Dossiatti