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Ouvir histórias de empresas familiares tradicionais é uma boa forma de aprendermos mais sobre Governança Familiar, já que as dúvidas em relação a esse tema são muitas. Boas histórias contribuem para romper paradigmas, identificar oportunidades e inspirar pessoas. Compreender como essas empresas implementaram a governança, as dificuldades que passaram e como solucionaram alguns dilemas nos faz descobrir que não estamos sozinhos nesta jornada e que há meios de organizar estruturas de governança, observando o contexto particular de cada empresa. O Instituto de Desenvolvimento da Empresa Familiar (IDEF) tem ouvido relatos de empresas familiares e compartilhado estes aprendizados com as famílias empresárias da nossa região. Neste conteúdo especial para a NOI trazemos a história de duas empresas tradicionais, a Paquetá - fundada por três famílias em Sapiranga (RS), que inicialmente fabricava apenas cinco pares de calçados por dia e hoje, passados mais de 70 anos, tem 16 mil colaboradores produzindo, diariamente, cerca de 50 mil pares de calçados e a ZEN S.A. - empresa de Brusque (SC), fundada em 1960 por dois irmãos, que manteve um papel notável no segmento automotivo ao longo dos anos, fabricando peças de automóveis, sendo uma empresa genuinamente brasileira, com alcance mundial. Os representantes das empresas, autoras das respostas que você confere a seguir são Sr. Jorge Dani Robert Colorio – Gestor Corporativo de Compliance da Paquetá; e Sra. Roberta Zen, Neta do fundador da Zen SA e Sócia Diretora da empresa RODA Software de Governança.

Instituto de Desenvolvimento da Empresa Familiar (IDEF): Sabemos que a Governança Corporativa preserva e otimiza o valor das organizações além de obter melhorias na gestão. Como sua empresa define governança?

PAQUETÁ - Governança é vista como um “controle” da estratégia do negócio.

ZEN - Governança Corporativa é sinônimo de perpetuação, sucessão e controle.

IDEF: Há formas de organizar a governança. Em que momento e de que forma a empresa organizou essa estrutura?

PAQUETÁ - Toda a estrutura societária da Paquetá foi montada em função do planejamento tributário. O primeiro passo em direção à Governança ocorreu em 1989, quando a empresa constituiu uma holding, a Cia. Castor. Com as três famílias fundadoras crescendo, a Cia. Castor se desdobrou e passou a ter outras seis holdings como sócias. Atualmente, nenhuma das famílias fundadoras tem controle majoritário. Cerca de 20 representantes/diretores atuam em conjunto na administração dos negócios.

ZEN - Na medida em que a empresa foi crescendo e a família aumentando, este tema se tornou recorrente. De 2005 a 2010 vários programas de implantação de Governança Corporativa foram realizados, envolvendo gestão, sócios e herdeiros. Hoje a ZEN conta com reuniões de sócios, Conselho de Administração e Conselho de Família. Cada estrutura tem seu regimento e objetivos. Quando somados, as melhores práticas de governança são adotadas e percebidas na rotina da companhia.

IDEF: Como foi o processo de implantação da governança?

PAQUETÁ - Até por volta do ano 2000, a Paquetá era uma empresa bastante voltada à exportação, pois não havia concorrência com outros mercados externos como a China. Neste período, que exigiu uma reinvenção da empresa, houve um trabalho intenso na área de controladoria, muito em evidência na época. Foi um marco na corporação porque redirecionou todo o negócio, originando um novo método de trabalho. Partindo de um planejamento estratégico, o processo de gestão foi evoluindo até a empresa dar início a um processo estruturado de governança, em 2013. Hoje o modelo chegou neste estágio: há um grupo controlador com um comitê de sócios, formado por cinco titulares e quatro suplentes (herdeiros) que se reúnem a cada dois meses. É o órgão mais importante da empresa. Aqui há algumas características próprias do grupo, onde os herdeiros participam do processo, até para se inteirarem dos problemas inerentes a qualquer empresa. Todo esse movimento de crescimento da empresa e das suas estruturas não é simples e exige planejamento e comprometimento das partes interessadas.

ZEN - As maiores dificuldades quando o tema é implantar as boas práticas de governança corporativa é encontrar uma pessoa que lidere o processo e engajar os demais envolvidos. Governança corporativa exige vários stakeholders trabalhando juntos para organizar uma série de processos decisórios e envolve direitos e deveres dos sócios e herdeiros.

IDEF: Como vocês organizaram o Planejamento Patrimonial visando a perpetuidade do negócio e proteção do patrimônio?

PAQUETÁ - Apesar da holding ter sido constituída em 1989, os diretores da holding e os diretores das empresas controladas eram os mesmos, então a holding tinha um papel mais jurídico, de criar uma proteção patrimonial, pois os filhos dos fundadores foram crescendo. Então qualquer problema que porventura acontecesse seria resolvido no âmbito da holding, nunca entrando em outras operações.

ZEN - Trabalhamos com holdings familiares, onde cada uma tem sua própria organização e investimentos. São nove sócios na segunda geração onde cada um tem sua holding pessoal. Os benefícios são, principalmente, tributários e, no caso de falecimento de um sócio, a sucessão para os herdeiros é facilitada. Alguns benefícios em pequenas despesas também podem ser percebidos quando se trata de pessoa jurídica.

IDEF: Que recurso vocês utilizam para organizar o sistema de governança e a comunicação entre conselhos, família e executivos?

PAQUETÁ - Até dois anos atrás as principais informações estavam reunidas num portal, mas o responsável não tinha controle de quem tinha acesso e, portanto, não era um ambiente totalmente seguro. Há dois anos, passamos a utilizar um software específico para governança, buscando duas coisas nele: a possibilidade de comunicação apenas com um grupo restrito e definido, e que houvesse domínio do negócio, já que com toda estrutura societária da empresa a confidencialidade das informações é algo extremamente sério. Além da segurança e do controle das informações, outra grande vantagem do programa é poder gerenciar os aspectos que envolvem a estrutura de governança com autonomia e da forma mais confortável possível, seja redigindo atas e publicando-as, seja convocando reuniões (com definição de pautas, dia e local, confirmação de presenças), onde o compromisso fica visível apenas às pessoas que têm acesso ao programa. Este software pode ser considerado a “cereja do bolo” que faltava para o pleno funcionamento de uma governança corporativa.

ZEN - Hoje todos os sócios, herdeiros e conselheiros possuem as informações organizadas, selecionadas para cada alçada, sendo possível o acesso via web e app por meio de um software específico para isso. Os principais benefícios são a segurança da informação e a organização das atas e documentos ligados à governança corporativa da companhia. Quanto mais organizada a informação, melhor a transparência e prestação de contas, pilares da boa governança.

Texto l Hana Witt - Especialista em Governança e fundadora do IDEF