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A Humanização do Direito

“O advogado não precisa mais ser um mero legalista”

Caroline Pierosan: No que consiste a humanização do Direito?

Aline Babetzki: É um movimento recente no meio jurídico. Começou na academia e agora o debate se estendeu à esfera profissional. Consiste em o advogado se colocar no lugar do seu cliente. Ele deve procurar sentir o que está sendo solicitado, e não ser um mero executor de leis, de ordens e de normativos jurídicos. É um trabalho que inclui envolvimento com o cliente. Ou seja, o advogado não precisa mais ser um mero legalista. 

Para ganhar causas, o advogado não precisa, muitas vezes, ser direto, frio e calculista? Como harmonizar a busca pelo ganho da causa com a atuação humanizada? 

São coisas distintas. Ganhar uma causa parte de uma boa estratégia, e uma boa estratégia pode estar humanizada ou não. Uma greve de empregados, por exemplo, em uma empresa que atrasou salários, é uma situação de conflito na qual, até então, pensávamos que o advogado precisaria ser frio e calculista. Ele não pode se envolver emocionalmente com a situação, mas aplicando técnicas da humanização do Direito, pode se colocar no lugar daquele empregado, daquele pai de família que está sem receber. Isso será fundamental para propor uma boa mediação, para conseguir fazer com que a empresa (que não tem recursos) possa conversar e procurar se entender com os empregados que precisam do seu salário. A estratégia é o mais importante e não a frieza do advogado.

Vi muitas vezes profissionais do Direito dizerem que empatia é “coisa de psicólogo”. Essa concepção está totalmente ultrapassada?

Exato. Até porque, no movimento de humanização do Direito a empatia é o conceito básico, é o pilar! Significa exatamente poder se colocar no lugar do cliente e formar com ele uma parceria para que o objetivo dele, especialmente, seja alcançado por meio da atuação do advogado.

O que o profissional do Direito (mais experiente) habituado à corrente anterior (frieza e objetividade) pode procurar no sentido de humanizar-se? Que tipo de atividade, leitura ou referência teórica?

Temos a Justiça Sistêmica e a Justiça Restaurativa, que são correntes que propõe o movimento de humanização do Direito. Até então essa tendência não havia chegado (e ainda está chegando) no âmbito do Direito Empresarial. Parece mais fácil falar de humanização do Direito quando pensamos em Direito de Família. Mas acredito que o profissional que deseja se contextualizar precisa adentrar esses universos independentemente da sua área de atuação. Inclusive na esfera do Direito Empresarial.

Por que que esse movimento é tão importante?

Apesar de hoje as relações se darem muito na esfera virtual, a profissão do advogado ela ainda é das relações humanas. No passado os advogados conseguiam exercer mais essa proximidade, porque éramos em menos pessoas, o mundo não era esta aldeia que nós vivemos hoje, em que conseguimos nos conectar com a China exatamente neste momento, ou com a Europa, ou com qualquer país do mundo, bastando ter um celular. Antigamente não havia essa possibilidade. Tudo era por intermédio do contato com as pessoas, por meio da relação humana. O que se pretende agora é a reaproximação das pessoas. É aproximar o cliente para que ele participe da construção da solução com sugestões, com ideias, trazendo a problemática dele e os seus sentimentos, para que o advogado, com a análise das leis e regulamentos, possa ajudá-lo a construir a solução.

Quais são os diferenciais que um advogado que pratica o Direito Humanizado pode oferecer?

O empresário hoje é muito mais informado, muito mais conhecedor de todas as áreas. Todo empresário conhece leis e regras, e conhece o negócio. O interessante, para o advogado, é aproveitar esse conhecimento e não simplesmente chegar e dizer ‘me dá aqui teu problema, eu vou levar isso para o meu escritório, e vou resolverei com base nas leis’ (numa atitude de ‘Não preciso te ouvir porque sei a lei’). O empresário conhece a realidade, conhece a sua empresa e sabe porque chegou naquela situação injusta ou justamente. O ideal é ser um ouvinte, interagir com o cliente, se colocar no seu lugar e aplicar na gestão do escritório técnicas que permitam essa aproximação. Devemos proporcionar canais para que o cliente possa acompanhar o processo mesmo à distância, facilitar o contato (por meio de um aplicativo, por exemplo), e ser um advogado acessível. No Direito Empresarial, a humanização do Direito consiste, além de ouvir, em se colocar no lugar do cliente. 

Bem comunicar parece se tornar cada vez mais importante. Qual é a relevância disso hoje? 

Vivemos em um mundo de informação. Basta acordar pela manhã e pegar o celular que podemos acessar a informação que quisermos. Então é imprescindível para o sucesso do seu trabalho que você esteja, também, inserido neste sistema de comunicação. A informação precisa estar acessível a todas as pessoas. Entendo que meus clientes, as pessoas com que me relaciono, o meu networking geral precisa receber isso de mim. Faz parte desta fase, faz parte deste momento, (obedecendo aos ditames legais e aos regramentos que a OAB determina) fornecer comunicação abundante e de qualidade. Sinto que é uma obrigação para com aquelas pessoas que nos relacionamos. 

De certa forma uma gentileza?

Exatamente.

 

ENTREVISTA I CAROLINE PIEROSAN
IMAGENS I JOSUÉ FERREIRA