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Caroline Pierosan

21/02/2019

E se a moeda fosse tempo?

 O fogo de um fósforo, é o que somos... ?

O que é, de fato, importante, hoje? Ter dinheiro? Ter água? Ter saúde? Ter informação? Ter conhecimento? Ter amigos? Ter internet?

Há um filme assim. Você já viu? Tudo é pago com tempo. As pessoas vão acumulando, 100, 200 anos, e vão gastando. Compram algo com 50 anos, outra coisa com dois... Há os suicidas, que doam todo o seu tempo, ou simplesmente não o “comercializam”, deixando-o passar. E há os ambiciosos (e também os assassinos), que saem e, por meio da violência, e de inúmeras outras artimanhas, sugam o tempo dos demais. Como é feita a transmissão? Cada um tem o seu dispositivo (o seu relógio da vida) no pulso direito. Para dar e receber tempo, basta encostar o pulso no do outro e os segundos, horas, dias, semanas, meses ou anos, vão “passando” para o seguinte. Pode-se observá-los correndo para mais ou menos, enquanto planeja-se o quão urgente tornou-se a sua batalha (se for você quem está tendo o tempo roubado), ou quanto luxo você poderá se dar de fazer mais coisas (caso seja você a quem o tempo está sendo dado). Poucas vezes um filme me fez pensar tanto.

O que é, de fato, importante, hoje? Ter dinheiro? Ter água? Ter saúde? Ter informação? Ter conhecimento? Ter amigos? Ter internet? Tudo está mudando. Nunca antes o homem pôde se comunicar tanto, com tantas outras pessoas, em tão pouco tempo. Costumo comentar que nunca posso fazer uma festa de aniversário “de corpo presente” pois meus melhores amigos estão espalhados pelo mundo. Estamos vivendo a nova Babel? A reunificação da espécie? Há povos em um canto do planeta, protestando por grupos que sofrem lá no outro continente; há crowdfundings por certa causa, geograficamente bem distante; ambientalistas de todos os lados estão indignados com o que fazemos com nossos recursos naturais aqui no Brasil, com os museus, com as pessoas – cujas mortes são calculadas na ponta do lápis por empresas que avaliam se vai valer a pena ou não parar um negócio para salvar algumas centenas de “pobres” – você viu, né? As planilhas da Vale.

Há jovens investindo todo o seu dinheiro em moedas virtuais, pois há outros jovens fazendo trading e compartilhando mais lucros do que qualquer banco jamais o fez, ali, no outro hemisfério (ou talvez aqui, do nosso lado). Mas é crime! Será? Não poderíamos, então, pagar mais aos funcionários para que tivessem mais tempo? Não poderíamos dobrar a comissão que pagamos, se quiséssemos? Não poderíamos dar um pouco do que temos para que o outro também fosse feliz, se decidíssemos que isso seria o que nos daria satisfação? Ou temos que ficar com o lucro todo para nós? Isso também não pode mudar? Novamente, se o dinheiro não fosse mais o nosso problema, de verdade, o que faríamos com o nosso tempo? Talvez esse momento surja para voltarmos a pensar no sentido de tudo, em quem, de fato somos, e do que, realmente, precisamos. Logo aquela desculpa de “mas aí, eu não tive dinheiro, por isso não fiz” talvez fique de lado. Importante pensar, pois nessa de pensar que, de fato nunca teremos o dinheiro necessário para fazermos o que realmente queremos, corremos o risco de não pensarmos em nada, ou de, de repente, como num susto, vermos que a vida sim, de fato, para nós, acabou.

Vamos reproduzindo comportamentos. Aceitando barreiras. Ficando inertes. Não arriscando, não experimentando, não nos permitindo mais encantar. A gente não dança, não canta, não pinta. Não damos risada, não conhecemos o próximo. Não viajamos, não passeamos, não compramos aquela melhor roupa que nos deixaria bonitos. Não aprendemos a tocar um instrumento, não praticamos um esporte, não fazemos aquele churrasco, não marcamos o café. A gente não sorri e não se encanta mais com quem está sorrindo na nossa frente. Não faz mais carinho na esposa, no marido, no filho, na avó, no nono, no neto. Vamos virando esse frio, escuro e imóvel grão de areia. É o fogo de um fósforo. É o que somos. Ao mesmo tempo, podemos (se quisermos) ser tão incrivelmente maravilhosos. Tão capazes de tornarmo-nos infinitos. Somos, de fato, um mistério.

Começamos 2019 com muitas revoluções ao nosso redor. Muita coisa para pensar, muita energia para administrar. Por que um texto tão filosófico, numa revista voltada a destacar o empreendedorismo nessa linda localização do planeta chamada Serra Gaúcha? Folheie as páginas, olhe bem para essas pessoas que lhe falam, e você entenderá. Há uma geração diferente surgindo, que está levantando para quebrar muitos paradigmas. Prepare-se, pois, está apenas começando. Tudo vai mudar e todos poderão, também (ou não), mudar. Já que o filme que comentei no início do texto ainda não é real, e estamos confinados aos nossos 80... 100 (120?) anos, o que vamos fazer com o nosso tempo?