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31/10/2019

Responsabilidade Objetiva por Acidente de Trabalho

O impacto da sobreposição de indenizações  

A responsabilidade civil objetiva é desproporcional e danosa à livre iniciativa

O Supremo Tribunal Federal julgou a arguição de “responsabilidade objetiva” do empregador por danos decorrentes de acidente de trabalho. É tema de grande relevância na pauta da segurança jurídica e da atividade empresarial e que onera o risco-Brasil.

O julgamento teve em vista o artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, que prevê, dentre os direitos do trabalhador, o seguro de acidente de trabalho por conta do empregador e a obrigação deste de indenizar, em casos dolo ou culpa. A tese levada ao recurso, vinda do Tribunal Superior do Trabalho, foi a da responsabilidade objetiva, de acordo com o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, que prevê a responsabilidade com base no risco da atividade.

No exame dessas normas e da legislação especial, prevaleceu o entendimento do relator ministro Alexandre de Moraes, de que não há impedimento para que as indenizações acidentária e civil se sobreponham. Com a decisão, o trabalhador que atua em atividade de risco tem direito à indenização por danos de acidente de trabalho, independentemente da comprovação de culpa ou dolo do empregador. A tese ainda não foi concluída, mas alguns ministros falam em estabelecer uma lista de atividades consideradas de risco. 

Para melhor compreensão do tema, nos sistemas de responsabilidade civil coexistem normas de “responsabilidade subjetiva”, que pressupõem apuração de culpa ou dolo; normas de responsabilidade por “culpa presumida ou risco”, com base na exposição a certas atividades; e normas de “responsabilidade objetiva”, que independe de culpa ou dolo para o dever de indenizar. A utilidade de cada uma varia segundo o campo de atuação do direito sobre os diferentes riscos.

Não nos parece apropriada a rigidez da responsabilidade objetiva declarada pelo STF, pois retira do juiz o poder de retroceder ao momento da ação ou omissão para verificar as causas do dano e qual delas foi a mais adequada a produzir o resultado. A matéria merece melhores contornos por parte do legislador, especialmente em tempos de liberdade econômica. A responsabilidade civil objetiva é desproporcional e danosa à livre iniciativa.

Nem sempre os danos são causados pelo empregador, haja vista os casos de facções criminosas, terrorismo, ataques cibernéticos, violência urbana, calamidades da natureza, ou mesmo a culpa concorrente da vítima, entre outros em que o empregador não é o causador direto do sinistro. Na prática, a decisão do STF poderá resultar em  dupla indenização pelas empresas: a reparação da vítima e a ação regressiva do INSS contra o empregador (Lei 8.213/91, artigos 120 e 121). Ambas correrão sobre os caixas das empresas.

Além de pagar contribuição mais agravada do Seguro de Acidente de Trabalho (SAT), a empresa pagará pelos danos ao trabalhador e, novamente, quando de ação regressiva interposta pelo INSS. O SAT é um seguro perverso quando se volta contra quem contribui com o seu pagamento, especialmente nos casos em que não se comprova culpa ou dolo do empregador. Ninguém merece um seguro que se volta contra o tomador.

No modelo atual, as empresas contribuem com 1% a 3% do total das remunerações, percentuais que podem se aproximar a 15% nas atividades de risco. É uma contribuição muito elevada, superior às taxas praticadas pelas companhias seguradoras nos seguros de pessoas.

Estudos atuariais e de modelo de outorga poderão apontar a forma mais adequada de concessão desses serviços às companhias de seguro, como no modelo europeu, seja por meio de pool de seguradoras ou livre mercado, mediante um adequado marco de seguros obrigatórios. Restabelecer o equilíbrio econômico e jurídico alterado pelo dano é um interesse coletivo, uma obrigação da sociedade e não apenas do empregador. Sobre o SAT, merece ser revisto do ponto de vista da outorga ao mercado, em forma de seguro obrigatório, e não como um tipo equivocado de tributo no contexto da Previdência Social.

Maurício Salomoni Gravina - Diretor Jurídico da CIC Caxias