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Juliana Dall'Onder

16/12/2020

Isolamento Social e Desenvolvimento Infantil

“O desenvolvimento vai depender muito do que lhe foi proporcionado no período de isolamento, da idade e da fase de desenvolvimento que se encontrava”

"Teremos crianças que sentirão medo de sair de casa, de ficar doente. Elas devem ser compreendidas e auxiliadas para que não se crie um trauma maior"

Caroline Pierosan: Como o isolamento social pode ter afetado o desenvolvimento cerebral dessa geração de crianças que hoje têm entre 1 e 10 anos e precisaram ficar longe da escola?

Juliana Dall’Onder: Essa questão poderá ser melhor respondida ao longo dos próximos anos. Não é algo simples de analisarmos. Mas veremos diversos grupos e diversas repercussões nessas crianças. O desenvolvimento vai depender muito do que lhe foi proporcionado no período de isolamento, da idade e da fase de desenvolvimento que se encontrava. Acho que o que será mais nítido será a disparidade de conhecimento adquirido pelas aulas a distância. Muitas escolas não tinham nenhum preparo para fornecer aulas on-line, demoraram mais para se adequar e outras ainda não conseguiram. Muitos alunos estão recebendo conteúdo para fazer as suas atividades em casa mas sem a possibilidade de um suporte profissional. E muitos pais não conseguem ajudar pois, por vezes, são pais que estudaram somente até anos iniciais e nem conhecem o conteúdo.

Quais são as faixas etárias mais prejudicadas pelo isolamento?

As crianças em fase de alfabetização (6 a 9 anos) por ser um marco importante no processo educacional que necessita um profissional com experiência para proporcional a alfabetização e os adolescentes que sofrem mais com o isolamento social. 

A falta de convívio com colegas da mesma idade tem alguma repercussão emocional para as crianças?

Com certeza. A pandemia veio de forma rápida e nos trouxe uma reviravolta muito grande. O início foi muito difícil; as incertezas, o medo, não saber quando poderíamos retornar... isso mexeu com todos nós. Alguns pequenos ficaram mais agitados pelo confinamento e os maiores ficaram tristes, sem ânimo, sem perspectiva.

E quanto ao desenvolvimento cerebral? Ele é afetado de alguma forma pelo isolamento – e quais são as implicações?

Essa pergunta é muito difícil de responder no momento pois estudos assim precisam de anos para ter suas conclusões. Mas o Brasil e o mundo têm diversas realidades sociais. Se analisarmos crianças que sofrem violência física ou psicológica em casa e que tinham na escola a sua fuga e a sua proteção, com certeza essas crianças terão um prejuízo imensurável pois terão mais tempo de exposição ao seu agressor. Se lembrarmos que muitas fazem sua única refeição diária na escola, estas também terão prejuízos enormes. Muito diferente de crianças que serão privadas de um convívio social e suporte educacional mas que vivem em lares mais adequados e sem privações. 

Há alguma coisa que os pais possam fazer para compensar essa falta de estímulos?

A estimulação por parte da família é fundamental sempre. Mesmo em tempos “normais”. E também é importante mantermos algumas regras, rotinas e horários mesmo em tempos de pandemia. As áreas e formas de estímulo variam de acordo com a faixa etária. É importante que as crianças sigam seu acompanhamento com pediatra para verificar se o desenvolvimento está de acordo com a idade; ele também poderá orientar formar de trabalhar. Hoje temos disponíveis muitas plataformas de auxílio. Existem aplicativos específicos com orientação de estimulação, vídeos no YouTube, além da própria caderneta da criança, fornecida pelo ministério da saúde no nascimento, que contém essas informações.

O estímulo técnico, oferecido pelas escolinhas surte um efeito muito diferente do estímulo proporcionado por alguém que cuide das crianças em casa?

Tudo depende do tempo e da qualidade da atenção que ofereceremos para a criança. Se os pais têm a possibilidade de dispor um tempo diáro para realizar atividades e exercícios com a criança e se ela não tiver nenhuma limitação, essa estimulação poderá suprir as necessidades do momento. Mas as crianças aprendem muita coisa por meio da imitação e da socialização, ou seja, observando outras crianças da mesma idade.

Seria então recomendado aos pais proporcionar algum tempo de convivência com outras crianças, enquanto as aulas não voltam ao normal? E quantas horas seria o ideal?

Sempre, em qualquer momento. Mais importante do que o tempo é a qualidade proporcionada. As crianças guardam para sempre os momentos especiais da sua infância. As brincadeiras com seus pais; a ajuda nos temas de casa, os passeios. É importante oferecer a elas atenção. Um tempo só delas, sem distrações.

O que fazer caso as crianças agora não queiram voltar à escola?

É preciso ter paciência. Teremos casos em que será necessário uma nova adaptação. Teremos crianças que sentirão medo de sair de casa, de ficar doente. Elas devem ser compreendidas e auxiliadas para que não se crie um trauma maior.

 

Entrevista I Caroline Pierosan