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Mauro Chies

12/01/2018

Denali (O Grande)

“Você vive (e às vezes sobrevive) o Denali, dia após dia, como o homem ancestral fazia. O cume é mera consequência”

O frio tremendo, o sol que nunca se punha, as mudanças climáticas súbitas e a aridez e imponência daquelas montanhas simplesmente são indescritíveis Chegar até a lindíssima cordilheira de montanhas geladas, próximas ao Círculo Polar Ártico foi uma expedição por si, mas nada do que eu vivi nas duas semanas na montanha poderia ser imaginado previamente O Denali é uma montanha "roots". É preciso levar tudo que se vai consumir por lá e trazer todo lixo de volta (inclusive os dejetos humanos) Montar e desmontar as barracas, cuidar de cada acampamento, cavar, construir muros de gelo, organizar os equipamentos e mantimentos requer trabalho constante Decolar da montanha em direção à pequena cidade de Talkeetna (onde uma cerveja artesanal e um banho merecido depois de mais de duas semanas de privação nos aguardavam) fez surgir um misto de alegria e saudades difícil de descrever Subir lentamente, durante vários dias, do acampamento base para os acampamentos superiores, levando trinta quilos na mochila A logística necessária para encarar esta montanha é tão grande quanto a paciência que se deve ter no caminho Do acampamento base onde o avião nos deixa até o cume (6.194 m) são 4 mil metros de desnível a serem vencidos em duas semanas Em Talkeetna (onde uma cerveja artesanal e um banho merecido depois de mais de duas semanas de privação nos aguardavam) fez surgir um misto de alegria e saudades difícil de descrever Anchorage, a maior cidade do Alasca, onde pegaria o primeiro dos três voos que me levariam para casa O Alasca é um lugar fantástico e selvagem e o Denali é seu maior ícone, uma montanha dura encravada em uma região sem igual De todas as montanhas em que já botei meus pés o Denali é sem dúvida a mais desafiadora Voltar do cume é igualmente desafiador e cansativo pois faz-se isso em apenas dois dias Você não escala o Denali, você vive (e às vezes sobrevive) o Denali, dia após dia, como o homem ancestral fazia. O cume é mera consequência

Escrevi estas linhas sentado confortavelmente com vista panorâmica no trem Denali Star, apreciando a paisagem bucólica de uma tarde de verão, rumo a Anchorage, a maior cidade do Alasca, onde pegaria o primeiro dos três voos que me levariam para casa. É estranho pensar que há quarenta e oito horas eu estava decolando do acampamento base do Denali onde há um rascunho de pista na geleira. Dias antes eu perambulava na vastidão da maior montanha da América do Norte (meu quarto dos Sete Cumes).

Olhei para as minhas mãos e o computador à minha frente enquanto escutava as informações da guia nesta viagem cênica, ainda não acreditando que não usava mais grossas luvas para me proteger do frio e vento que há poucos dias poderiam ter danificado irremediavelmente meus dedos. Chegar até a lindíssima cordilheira de montanhas geladas, próximas ao Círculo Polar Ártico foi uma expedição por si, mas nada do que eu vivi nas duas semanas na montanha poderia ser imaginado previamente. O frio tremendo, o sol que nunca se punha, as mudanças climáticas súbitas e a aridez e imponência daquelas montanhas simplesmente são indescritíveis. Subir lentamente, durante vários dias, do acampamento base para os acampamentos superiores, levando trinta quilos na mochila e mais cerca de vinte no trenó atado a minha cintura (em fila indiana, em completo silêncio, ligado por um cordão umbilical de quase dez metros ao montanhista da frente e ao de trás) foi uma experiência reveladora.

O Denali é uma montanha “roots”. É preciso levar tudo que se vai consumir por lá e trazer todo lixo de volta (inclusive os dejetos humanos). Montar e desmontar as barracas, cuidar de cada acampamento, cavar, construir muros de gelo, organizar os equipamentos e mantimentos requer trabalho constante. Do acampamento base onde o avião nos deixa até o cume (6.194 m) são 4 mil metros de desnível a serem vencidos em duas semanas. A logística necessária para encarar esta montanha é tão grande quanto a paciência que se deve ter no caminho, um sobe e desce diário, levando mantimentos para partes mais altas, enterrando-os a 2m na neve, voltando ao acampamento inferior e assim por diante. No final das contas sobe-se o Denali duas vezes e não uma. Voltar do cume é igualmente desafiador e cansativo pois faz-se isso em apenas dois dias. Decolar da montanha em direção à pequena cidade de Talkeetna (onde uma cerveja artesanal e um banho merecido depois de mais de duas semanas de privação nos aguardavam) fez surgir um misto de alegria e saudades difícil de descrever.

O Alasca é um lugar fantástico e selvagem e o Denali é seu maior ícone, uma montanha dura encravada em uma região sem igual. De todas as montanhas em que já botei meus pés o Denali é sem dúvida a mais desafiadora. Você não escala o Denali, você vive (e às vezes sobrevive) o Denali, dia após dia, como o homem ancestral fazia. O cume é mera consequência.